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sábado, 15 de agosto de 2009

Opinião: "Talvez a mídia deixe de ser um emprego e se transforme num hobby"

Por Frank Horni, publicado na UOL-Notícias

Em entrevista à "Spiegel", Chris Anderson, editor-chefe da revista Wired de tecnologia e cultura, discute o desafio da Internet à imprensa tradicional, os novos modelos de negócio na web e porque ele prefere ler o Twitter a um jornal diário.

Spiegel: Sr. Anderson, vamos falar sobre o futuro do jornalismo.
Anderson: Esta será uma entrevista muito tediosa. Eu não uso a palavra jornalismo.
Spiegel: Tudo bem, e quanto aos jornais? Eles estão em maus lençóis tanto nos Estados Unidos como no resto do mundo.
Anderson: Desculpe, eu não uso a palavra mídia. Não uso a palavra notícia. Não acho que essas palavras signifiquem alguma coisa hoje. Elas definem o mundo editorial do século 20. Hoje, são uma barreira. Elas estão bloqueando nosso caminho, como uma carruagem sem cavalos.
Spiegel: Quais palavras você usa?
Anderson: Não há outras palavras. Estamos numa daquelas épocas estranhas em que as palavras do século passado não têm mais significado. O que notícia significa para você, quando a maior parte das notícias é criada por amadores? São as notícias vindas de um jornal, de um grupo de discussão ou de um amigo? Eu simplesmente não consigo pensar numa definição para essas palavras. Aqui na Wired, nós paramos de usá-las.
Spiegel: Espere um minuto. Os chamados jornalistas cidadãos e blogueiros mudaram o significado da palavra "mídia". Mas sem os meios de comunicação tradicionais eles não teriam muito a fazer na verdade. A maioria dos amadores comenta o que a imprensa de qualidade informa. A pergunta é: você leu um jornal hoje de manhã?
Anderson: Não.
Spiegel: O jornal do lugar onde você mora, o San Francisco Chronicle, está lutando pela sobrevivência. Se ele desaparecesse amanhã...
Anderson: ... Eu não perceberia. Eu não saberia nem mesmo o que estaria perdendo.
Spiegel: Então como você se mantém informado?
Anderson: A informação surge de muitas formas: pelo Twitter, aparece no meu inbox, na minha base de RSS, através de conversas. Eu não saio procurando por ela.
Spiegel: Você simplesmente não se preocupa.
Anderson: Não, eu me preocupo. Você sabe, eu escolho minhas fontes, e eu confio nas minhas fontes.
Spiegel: Assim como milhões de pessoas confiavam na mídia tradicional.
Anderson: Se aconteceu alguma coisa importante no mundo, eu vou ficar sabendo. Fico sabendo dos protestos no Irã antes de eles aparecerem nos jornais porque as pessoas que eu acompanho no Twitter se preocupam com essas coisas.
Spiegel: O New York Times, a CNN, a Reuters e outros podem publicar suas melhores reportagens na internet que você nunca as lê?
Anderson: Leio muitos artigos da mídia tradicional, mas não a procuro diretamente para lê-los. Eles chegam até mim, o que é muito comum nos dias de hoje. Cada vez mais pessoas estão escolhendo filtros sociais para ler as notícias em vez de filtros profissionais. Estamos nos desligando das notícias da televisão, dos jornais. E ainda assim ficamos sabendo das coisas importantes; só que não é mais aquela saraivada de notícias ruins. São notícias que importam. Acho que no momento em que algo chega até mim é porque foi avaliado por pessoas em que eu confio. Então as bobagens que não importam não vão chegar até mim.
Spiegel: Mas você também pode descrever o fluxo infinito de palavras que vêm do Twitter como bobagem. Limitadas aos 140 caracteres, as mensagens do Twitter resultam numa impressão maluca, sem filtros nem comprovação, do que está acontecendo. As mensagens do Twitter não podem ser nenhum tipo de substituto para as reportagens e análises rápidas, abrangentes e bem fundamentadas da mídia de qualidade. E com todo o respeito, você mesmo produz esse tipo de informação. Você é um membro da mídia noticiosa, você trabalha para uma revista, faz entrevistas e cria notícias - ou informação, ou conteúdo, ou qualquer seja o nome que queira dar a isso.
Anderson: É verdade. Mas o problema não é que a forma tradicional de escrever não vale mais. O problema é que isso hoje é a minoria. Costumava ser um monopólio, costumava ser a única foma de distribuir notícias.
Spiegel: Porque as empresas de notícias costumavam controlar os processos de impressão e as ondas aéreas?
Anderson: Exatamente. Então agora que não precisamos mais do acesso a um canal comercial para distribuir [notícias], qualquer um pode fazê-lo. O que nós fazemos continua sendo útil, mas o que as outras pessoas fazem é igualmente útil. Não acho que o nosso jeito seja o mais importante e com certeza não é a única forma de transmitir informações. Então é por isso que estamos numa fase estranha. Levará uma década ou duas para entendermos o que é que estamos fazendo.
Spiegel: Mas mesmo com esse entusiasmo pelos novos formatos e pela mídia baseada na internet, a demanda por jornalismo de qualidade está crescendo, e não diminuindo. A mídia online conquistou uma audiência nova e enorme. E apesar de todos os rumores de extinção da mídia impressa, as circulações continuaram notavelmente estáveis. O problema é a queda da arrecadação com publicidade.
Anderson: Os jornais não são importantes. Pode ser que sua forma física e impressa não funcione mais. Mas o processo de compilar informação e analisá-la, acrescentando valor a ela e a distribuindo, ainda funciona.
Spiegel: Mas onde está o modelo de negócio web para isso?
Anderson: Ainda estamos tentando descobrir.
Spiegel: Boa sorte - um futuro que não se sustentará sozinho.
Anderson: O anúncio em banner foi inventado bem aqui nesse escritório em 1995. Essa foi a primeira resposta à sua pergunta. Mas não há um modelo de negócio, há milhares. Cada um de nós deve descobrir o seu próprio. Todos nós ganhamos dinheiro, mas não ganhamos o suficiente - e não tanto quanto ganhávamos no meio impresso. O Facebook está tentando descobrir como, o
Twitter também. Chegaremos lá. Ainda é muito cedo.
Spiegel: Qual é a resposta da Wired?
Anderson: Do outro lado do corredor, funciona a wired.com. Ela tem cerca de 120 milhões de pageviews por mês, é um dos maiores sites do mundo. Nós basicamente a tocamos sem lucro nem prejuízo. Mas isso é totalmente arbitrário; nós decidimos como fazer. Temos jornalistas pagos e blogs. Há conteúdo gerado por usuários e conteúdo da revista, com histórias de 8 mil palavras, pesquisadas durante seis meses. Algumas partes são editadas, outras não. Temos milhões de faturamento, e decidimos se queremos ter lucro ou não.
Spiegel: Outros não querem, ou não podem, levar isso tão na esportiva. Eles fazem dinheiro no meio impresso e o usam para construir ou financiar seus produtos online. Agora muitos, como o New York Times, estão perdendo grande parte de seu faturamento impresso e não conseguem gerar receita suficiente com seus websites. Daqui a algum tempo, isso será um grande problema.
Anderson: A matemática do lucro é muito fácil, faturamento menos custos. Você dá o seu melhor no faturamento e se não está conseguindo lucrar, tem que reduzir os custos. O problema não é que não haja dinheiro para ganhar online, é simplesmente que nossos custos são muito altos.
Spiegel: Ou talvez os faturamentos sejam muito baixos. Por que os anunciantes pagam menos online do que no meio impresso? A audiência da wired.com é menos atraente do que os leitores da revista Wired?
Anderson: Tem a ver com a eficiência. As pessoas online tendem a não olhar para os anúncios. No impresso, as pessoas tendem a olhá-los porque os anúncios são mais bonitos e bem integrados. Eles são grandes, de página inteira, com fotos boas. Sob vários aspectos, eles são conteúdo. É por isso que os anunciantes gastam US$ 22 para alcançar mil pessoas na wired.com - e US$ 100 na revista. Acho que ainda não descobrimos o veículo perfeito para a propaganda online.
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